A desestabilização ocorrida no reino português trazida pelas invasões francesas foi profunda e trouxe consequências diretas para suas colônias. As novas correntes de pensamento vão atingir inclusive Moçambique, embora com fraca expressão política. As idéias reolucionárias foram veiculadas, mais em razão do contato comercial existente com os franceses que habitavam as ilhas vizinhas do Oceano Índico – o arquipélago das Mascarenhas, composto pelas Ilha de França ou Maurícias e Ilha de Bourbon ou Reunião -, do que através das naus portuguesas ou dos barcos brasileiros que se dedicavam ao tráfico de escravos com a América.188.
As idéias revolucionárias francesas seguiam determinadas trajetórias, e como conclui José Capela, circulam no mesmo sentido das rotas do tráfico negreiro que passavam pela costa oriental africana, isto é, pela via França (Nantes, Bordéus e Marselha)-Índico (Moçambique e Maurícias)-América (São Domingos e Brasil)190.
Os franceses eram dependentes da costa oriental africana (Moçambique, Querimbas, Lourenço Marques e Inhambane) para o fornecimento de mão-de-obra, que era utilizada nas vastas plantações existentes nas Mascarenhas. Por isto, não vieram a hostilizar ostensivamente a colônia portuguesa.
Além disso, os enclaves suahílis dispersos pela costa moçambicana exportavam, clandestinamente, escravos para os franceses. Eram até mesmo os locais preferidos pelos negociantes franceses, por não terem que pagar os direitos de exportação.193 Os escravos eram utilizados principalmente na agricultura (café, algodão, mandioca, anil e cana-de-açúcar) e criação de gado, além dos serviços dos navios e transporte terrestre.194
Apenas quando a belicosa rivalidade anglo-francesa chegou ao Índico, foi que os barcos portugueses viram-se impedidos de dirigir-se às Maurícias, por conta das represálias inglesas.195
Uma vez terminada a guerra com os franceses, foram normalizadas e reatadas as relações comerciais, inclusive com a abertura dos portos das duas nações à navegação mercantil. O comércio com as Mascarenhas teve continuidade até 1873, com os 3 a 4 barcos franceses que freqüentavam os portos moçambicanos, transportando cerca de 1500 escravos a cada ano.197
Os franceses estabelecidos nas Ilhas Mascarenhas, buscavam aumentar suas importações de escravos com a finalidade de obter mão-de-obra suficiente para dar conta da demanda resultante do desenvolvimento agrícola, que se encontrava em marcha naquele território.
Para tanto, além de concentrar sua procura por escravos junto à costa suahíli de Quíloa, voltaram-se também para as Ilhas Querimba como fornecedoras de escravos.
Estas últimas acabaram por se envolver num intenso comércio clandestino de escravos com os franceses.
E, no alvorecer do século XIX, aos franceses vieram se juntar os brasileiros, cubanos e norte-americanos, como participantes deste giro em rota ascendente, que acabaria por transfigurar completamente Moçambique.
Esse crescimento do comércio negreiro pode ser percebido pela publicação em 1800, de um decreto isentando de direitos os escravos que saíam de Moçambique em direção ao Pará e Maranhão.200 E, em 1809, será o próprio príncipe regente D. João quem dará instruções ao Almirante General, no sentido de ordenar ao governador de Moçambique, o envio da galera Aurora, carregada de escravos para o Rio de Janeiro.201
Várias circunstâncias concorriam para o viragem econômica, em que o ouro e o marfim perdiam espaço para o escravo, como principal produto de exportação. Dentre as quais se destaca a prosperidade econômica do Brasil, proveniente do ressurgimento da produção açucareira e o sucesso das fazendas de café no Vale do Paraíba demandava um grande número de escravos.
A Zambézia vai passar a suprir essa demanda, pois, no norte de Moçambique, as tradicionais rotas negreiras terrestres já não davam conta da crescente procura. Zonas marginais no tráfico negreiro, como as do rio Zambeze,começaram a chamar a atenção de empresários estrangeiros do tráfico, brasileiros principalmente.
http://dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/1884/7418/1/JRBPortella_tese.pdf
188 Os franceses haviam tomado posse da Ilha de Bourbon em 1642 e ocuparam a Ilha Maurícia em 1714, após seu abandono pelos holandeses em 1710.
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